Nova Lei Fundiária da Amazônia
é Inspirada na Colonização Africana
As colonizações de África e Américas distam 2.600 anos entre si. Entretanto, fenícios, gregos e romanos dominaram tribos autóctones africanas de formas semelhantes às quais ingleses, espanhóis e portugueses dominaram aldeias ameríndias.
A expansão do capitalismo industrial no século XIX, impulsionou o neocolonialismo africano e desenhou seu mapa atual, cuja partilha territorial foi regulamentada na Conferência de Berlim (1884) entre países europeus. Da mesma forma, o neoliberalismo do século XXI avançou sobre o último grande território ainda não totalmente incorporado pelo mercado mundial: a Amazônia. Uma abordagem dialética indica que a Lei da Grilagem (2009) significa historicamente para a Amazônia o mesmo que a Conferência de Berlim representou para à África anteriormente.
A colonização da Amazônia, iniciada no século XVI, jamais conferiu consistência jurídica à posse da terra, a maioria pública, e ocupada por populações autóctones há mais de 10 mil anos. Privilegiou poder socioeconômico e violência, em detrimento de lei ou direitos tradicionais. Após cinco séculos de conflitos, o Estado finalmente fez a regularização fundiária na Amazônia: legalizou o trinômio força/colonização/expropriação, através da conversão da MP 458/09 na Lei 11.952/09, sancionada pelo governo Lula em junho. A partilha amazônica em Brasília hoje, lembra a partilha da africana em Berlim há 125 anos. Antes eram nações, hoje são corporações.
A Amazônia é a principal mega-biodiversidade do globo, sendo 59% do Brasil. O potencial econômico dessas terras possui magnitude assustadora, capaz de interferir na geopolítica global. Deriva de uma gama de recursos minerais, hídricos, energéticos, biogenéticos, florestais, farmacêuticos, antropológicos, bioquímicos, nutricionais entre outros. Cerca de 70% das pesquisas científicas sobre a região são realizadas por estrangeiros. A abrangência da Lei, portanto, extrapola a problemática estrita da posse da terra. Significa, na verdade, um contrato jurídico-social consolidador de diretrizes de longo prazo sobre o uso estratégico de recursos amazônicos e o futuro do Brasil e do globo.
O cenário é maior que interesses de beneficiários imediatos da medida: a tropa de choque dessa Lei Colonial, é composta por governistas, ruralistas e empreiteiros. O seu significado antropológico é maior. Em poucas décadas, extensões de biodiversidades inestimáveis podem ser unificadas em grandes territórios na Amazônia, partilhado por grupos econômicos. A Lei permite a titulação e o redesenho da titularidade inicial em poucas décadas, atingindo no mínimo 170 milhões de hectares de riquezas inestimáveis.
A geografia federativa brasileira pode desaparecer, diante dos territórios econômicos privados a serem implantados na Amazônia futuramente, fruto da Lei 11.952/09 – Lei da Grilagem.
As resistências da sociedade a tais medidas têm sido insuficientes. A oposição do Governo Federal e sua bancada no Congresso Nacional, trouxe duas conseqüências imediatas no campo da macro-política brasileira – a saída da Senadora Marina Silva (PT/AC) que, provavelmente, disputará a Presidência da República pelo PV e a aproximação programática do Deputado João Capiberibe (PSB/AP) com mo PSOL. Tratam-se das duas principais lideranças ambientais independentes de caráter nacional da Amazônia que romperam com esse modelo anti-ambiental africano-amazônico.
Kenzo Jucá – Sociólogo (UFPA)
Especialista em Desenvolvimento Sustentável e
Direito Ambiental
Mestre em Política e Gestão Ambiental (CDS-UNB)