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16/12/2008 - Crise desmoraliza neoliberalismo
Em todo o mundo começa a ser questionada em profundidade a máxima de que o mercado ´é a solução' para os problemas econômicos e sociais.

Por Gilberto Alcântara

                  Como dizia o velho pensador Karl Marx, no século XIX, “o fenômeno das crises econômicas é inevitável e inerente ao sistema capitalista. Elas revelam a emergência da dimensão negativa de um sistema marcado pela contradição”. Como se vê, é uma posição diferente da dos economistas, que se dizem modernos e vêem no mercado a resposta para todos os problemas da economia, defendendo a tese do Estado mínimo. Esses economistas estão atônitos com a crise financeira que arrasa a principal matriz do capitalismo, os Estados Unidos, e em redemoinho leva à bancarrota grande parte das economias no planeta.
                  Segundo o economista franco-polonês Ignacy Sachs, vivemos hoje num Capitalismo de Cassino. Cada vez que as bolsas de valores sobem e descem, tem gente que ganha muito dinheiro, porém outros caem em desgraça. O aspecto fundamental dessa crise é que 30 anos de neoliberalismo arrogante, que acreditava no mito dos mercados auto-reguladores, sofreram o mesmo baque que o socialismo real com a queda do muro de Berlim. É mais um paradigma falido.
                  Trata-se de uma crise anunciada, decorrente das próprias limitações e contradições do sistema, especialmente a super acumulação de capitais, resultante da necessidade de maximização dos lucros em contrapartida à escassez cada vez maior de mercado. Ela é fruto de uma utopia gerada no cerne do capitalismo. O fato é que. hoje, há uma super acumulação de capitais em todo o planeta (estima-se em centenas de trilhões de dólares) que operam em mercados fictícios, sem qualquer relação com a produção de bens e serviços. Portanto, desvinculadas do atendimento das necessidades básicas da humanidade.
                  Ainda não é o fim do capitalismo, mas talvez seja a agonia do caráter neoliberal que hipertrofia o sistema financeiro. Acumular fortunas tornou-se mais importante que produzir bens e serviços. A bolha especulativa inflou e, súbito, estourou. Repete-se, contudo, a velha receita: após privatizar os ganhos o sistema socializa os prejuízos. Desmorona a cantilena do menos Estado e mais iniciativa privada. Na hora da crise, apela-se ao Estado como bóia de salvamento na forma de bilhões/trilhões de dólares (quase 10% do PIB dos EUA ou mais que o custo de todo petróleo consumido em um ano naquele país) a serem injetados para anabolizar o sistema financeiro.
                O presidente francês, Nicolas Sarkozy, conhecido na França por suas idéias de extrema direita, junto com líderes da União Européia, está organizando uma reunião para discussão da Refundação do Capitalismo. Significa dizer que reconhecem as limitações do sistema atual, principalmente pelo seu caráter excludente. Isso pode significar um enorme passo adiante para a humanidade. E permite começar a discutir em que base, e a partir de que postulados, se fará tal refundação.
               Já que é premeditado falar no fim do capitalismo, não podemos nos furtar nesse momento de lutarmos pela eliminação dos tumores malignos gerados por tal sistema – a fome, a miséria e a exclusão social de bilhões de pessoas. Quem pagará a fatura do Proer usamericano? O contribuinte! Somente nos EUA prevê-se o desemprego de 11 milhões de pessoas vinculadas ao mercado de capitais e à construção civil. Os fundos de pensão, descapitalizados, não terão como honrar os direitos de milhões de aposentados, sobretudo daqueles que investiram em previdência privada.
              Por outro lado, o Proer usamericano, o programa Bolsa-Fartura de Bush, reúne quantia mais do que suficiente para erradicar a fome no mundo. Mas quem se preocupa com os pobres? Segundo Jacques Diouf, diretor-geral da FAO (Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), devido ao aumento dos preços dos alimentos, nos últimos 12 meses o número de famintos crônicos subiu de 854 milhões para 1 bilhão de pessoas. Dados da ONU apontam que cerca de dois terços da humanidade vivem entre a miséria e a pobreza, com renda diária inferior a US$ 2 (dois dólares). São 4 bilhões de pessoas sem acesso a bens essenciais de consumo e direitos de cidadania, como alimentação, saúde, educação, água potável e endereço certo.

Os Reflexos da Crise na Economia Brasileira      
  
             A crise demonstra claramente a falência do neoliberalismo e a importância do Estado. Nos países em desenvolvimento é fundamental que se discuta de forma transparente; sem o proselitismo do presidente Lula – que expõe na mídia uma falsa verdade. “Não ajudarei aqueles que perderam dinheiro com a especulação”, mas na realidade segue o mesmo receituário de Bush – Proer para os bancos, agronegócio e  construtoras.
             Diferente do discurso presidencial, grandes empresas como a Vale do Rio Doce e a Petrobras já começam a tomar medidas recessivas, como redução na produção de minério e petróleo. Uma série de indústrias, em São Paulo e outros estados, já iniciaram férias coletivas e falam até em PDVs (planos de demissão voluntária).
            Certamente o volume de recursos empenhado para auxiliar os ‘pobres-coitados’ dos banqueiros, cerca de US$ 53 bilhões (cinqüenta e três bilhões de dólares), segundo informe do Banco Central, não prevê um centavo para geração de emprego, fomento e incentivo ao pequeno e médio empresário, a agricultura familiar etc.. Nada que fortaçeça o mercado interno; e que evite a disparada no custo dos alimentos por pressões do mercado externo; nada que baixe os juros.
             Falando sobre a eleição de Barack Obama nos EUA, o presidente Lula disse que foi a vitória da esperança contra o medo, insinuando que crê num novo salvador da pátria (isto é, do capitalismo). É bom rememorar que, em 2002, o povo brasileiro elegeu a esperança, mas em 2003 Lula já aparecia o maior gerente do projeto neoliberal para a economia brasileira. Agora, não bastará “projetos sociais” tipo Bolsa-Família, Luz nas Trevas etc., para amenizar os efeitos da crise, mesmo porque poderá faltar recursos para tal perfumaria.    



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